Não, não consigo fazer isto. Não consigo não querer saber, não consigo não me importar, não consigo não sentir, não consigo "jogar para trás das costas" e fingir. Não, não consigo. Posso dizer que sim, mas o sim é não; o sim é sempre não. Sinto a tua falta mais do que sei explicar. Sinto a tua falta mais do que sei entender. À luz do primeiro desespero, achei que não sabia viver sem ti, que não conseguiria viver sem ti, que precisava de ti para respirar; com o tempo, porque não claudiquei, tenho vindo a perceber que sei, consigo, posso viver sem ti. O sol continua a levantar-se e a pôr-se, como todos os dias, como todas as noites. E eu continuo viva. Portanto sei viver sem ti, consigo viver sem ti e não preciso de ti para respirar. Não sou nem me sinto dependente de ti. Não é por isso que sinto a tua falta. Não sinto falta de que me preenchas o tempo; até gosto de tempo livre, de tempo só para mim. Não é pelos espaços em branco e em silêncio. Não é da rotina que sinto falta. Não é o hábito que me mata. Já nem sequer são os planos, embora sejam mais os planos que qualquer coisa das referidas antes. Eu posso viver sem ti. Eu posso levantar-me de manhã e cumprir as minhas obrigações, posso fazer até mais que cumprir as minhas obrigações; posso sentar-me num banco de jardim e ter um livro na mão, posso sentar-me numa esplanada e beber uma cerveja enquanto fumo um cigarro, posso descobrir sítios novos, posso fazer novas amizades, posso deitar-me à noite com a certeza de ter tido um bom dia, de ter tido um dia que valeu a pena. Eu posso viver sem ti. É a frase que está mal escrita. O problema reside na frase mal dita, mal escrita. "Eu não posso viver sem ti" é uma falácia, não é verdade. A verdade é outra, de outra cor. A verdade é: eu não quero viver sem ti! Eu não quero viver sem ti, mesmo que tenha de viver contigo sem ti. Não quero esquecer-te. Não quero apagar nada. Não quero deixar de pensar em ti. Não quero deixar de ter saudades, não quero deixar de trazer-te dentro de mim a cada momento. Era a frase que estava mal escrita. Esta é a minha escolha. Tu és a minha escolha. Eu posso, mas não quero. E isso não muda nada em relação ao estado físico, concreto e objectivo das coisas. As coisas são o que são e já não existe um nós físico, real. Mas existe um nós dentro de mim. Um nós infinito. Agora que a frase está correcta, posso descansar um bocadinho.
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