Às vezes, quando um carro passa à minha porta e - por breves instantes e variadas razões - fica parado, imagino que és tu. Durante esses instantes que são breves e se tornam eternos, imagino centenas de cenários; uns possíveis, outros nem tanto. Nenhum provável. Às vezes, claro, imagino que vens dizer que me amas e que não queres e não podes viver sem mim; que sou tudo: ar, água, terra, fogo, tudo. Outras vezes, imagino que vens despedir-te de mim; chegas, pedes que vá lá abaixo e entre no carro e, quando estou sentada ao teu lado, inclinas-te para mim e beijas-me pela última vez, pedindo-me que o recorde. Às vezes, claro, imagino que vens, de novo, pedir-me que seja tua; não teria resposta para te dar: sou tua, hei-de ser sempre tua.; qual é a dúvida? Outras vezes, imagino que queres apenas ver-me; pedes-me que desça, olhas para mim, dizes qualquer coisa sobre saudades, abraças-me e vais embora. Às vezes, claro, imagino que vens fazer uma declaração ao estilo The Notebook: “So, it's not gonna be easy. It's gonna be really hard. We're gonna have to work at this every day, but I want to do that because I want you. I want all of you, forever, you and me, every day." Outras vezes, imagino que estavas a ter um dia difícil e que quiseste apenas passar por cá para falar um bocadinho comigo, para sentir um bocadinho o conforto da minha presença. Sei lá se a minha presença é um conforto, estou apenas a montar cenários. Às vezes, claro, imagino que vens matar esta sombra que teima em crescer dentro de mim, que vens dizer-me que não passou tudo de um pesadelo, que está tudo bem. Outras vezes, imagino que vens dar-me qualquer coisa minha que andasse esquecida por tua casa; como pretexto, naturalmente. Às vezes, claro, imagino que vens pedir-me em casamento, aquele pedido que fizeste tantas vezes e que dizias um dia ir transformar-se "num pedido como deve ser"; talvez nunca to tenha dito, mas de todas as vezes em que me olhaste nos olhos e me disseste "casa comigo, fica comigo para sempre", recebi-o como "um pedido como deve ser". [Recebi-o como "um pedido como deve ser" um dia antes dos dias terem acabado, sentada no sofá da sala, onde agora não consigo sentar-me sem que as lágrimas me procurem.] Outras vezes, imagino que vens e não dizes nada; ficas a olhar para mim e os teus olhos dizem tudo e os meus olhos respondem tudo. Aqui, no silêncio gritante do meu quarto, nas paredes carregadas de memórias que me envolvem, no espelho gigante que te reflecte sem cá estares, na cama onde ainda encontro o teu cheiro, fico parada a ouvir os carros passar e a imaginar-te chegar. Aqui, rodeada pelas almofadas que tantas vezes jogámos ao chão, fico parada a ouvir os carros passar e a imaginar-te chegar, enquanto, pelo rosto, deslizam lágrimas que sussurram "adeus, meu amor".
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